quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Placas cerâmicas - Ferreira da Silva - SECLA

O ceramista Luís Ferreira da Silva (n.1928) vem juntar-se ao grupo de artistas plásticos que colaboravam com a SECLA, inicialmente como chefe da secção de pintura, a partir de 1954.
Ainda adolescente, frequentou a Escola Avelar Brotero em Coimbra, cidade onde inicia o seu trabalho em cerâmica, na fábrica Coimbra Frutuoso, mudando-se seguidamente para o Bombarral, onde trabalhou na Cerâmica Bombarralense.
Mais tarde, trabalha em Alcobaça, assumindo o cargo de pintor cerâmico, primeiro na Vestal e depois na Olaria de Alcobaça.
A vasta experiência e as qualidades criativas do seu trabalho, são as razões fundamentais para Alberto Pinto Ribeiro, director e fundador da SECLA, o convidar para trabalhar na fábrica, à época em plena expansão.
Em 1958, Ferreira da Silva afasta-se da SECLA por um período de dois anos em que desenvolveu peças de autor na oficina de Afonso Angélico, também nas Caldas da Rainha.
Estas peças eram comercializadas na Sopal, uma loja no Chiado, importadora de objectos escandinavos. O contexto era perfeito uma vez Ferreira da Silva se aproxima em larga medida da produção escandinava, líder de tendências no design de objectos durante as décadas de 50 e 60.
De regresso à SECLA, inicia um fértil período de experimentação, entre 1960 e 67, dando início ao chamado Curral, o espaço oficinal onde trabalha com um oleiro, um preparador de pastas e um modelador para a produção de placas decorativas e outros objectos em maior quantidade.


SECLA - dezoito placas decorativas, 90 x 45 cm. © CMP


Estas placas decorativas, ou azulejos, são feitos em pasta refractária e barro vermelho chamotados com vidrados alcalinos e engobe preto dourado. 
A decoração é incisa, explorando elementos geométricos dispostos de modo concêntrico, quadrados e círculos rematados por cercaduras de inspiração primitiva, fortes texturas e cores, tirando partido das qualidades matéricas.


SECLA - placas decorativas. © CMP

Embora a maior parte das peças produzidas no Curral fossem peças únicas, Ferreira da Silva também colaborou na criação de elementos decorativos, sobretudo para peças em grog (mistura de vários tipos de grês),  painéis e mesas com armação em ferro, tendo obtido especial relevância em mostras internacionais.
O seu ecletismo e flexibilidade permitiram-lhe explorar vários materiais, trabalhando, não só a cerâmica, mas também a escultura em cobre e ferro, a gravura e pintura, experimentando ainda outros materiais, muitas vezes conjugados de forma surpreendente.
Na SECLA encontra o espaço ideal para desenvolver a sua obra de autor, tirando partido das infraestruturas e condições técnicas que a fábrica lhe proporciona.
Contribui também para prestigiar a imagem da empresa no exterior, numa relação simbiótica que a ambos convém porque ambos beneficia, uma vez que nas exposições internacionais a SECLA mostrava sobretudo peças de autor.
Em 1960, a SECLA obtém o reconhecimento nos EUA com a exposição na Architectural League de Nova Iorque. 



 
Montra na 5ª Avenida expondo as peças de Ferreira da Silva, 1960. Imagem publicada em A Nova Cerâmica da Caldas, da autoria de Alberto Pinto Ribeiro, 1989.


Vista parcial da exposição da SECLA na Architectural League NY, mostrando peças de Ferreira da Silva, 1960. Imagem publicada em A Nova Cerâmica da Caldas, da autoria de Alberto Pinto Ribeiro, 1989.




Página da publicação Building Products Guide for Interior Design and Decorating, mostrando peças expostas na Architectural League NY, 1960. Reproduzida em A Nova Cerâmica da Caldas, da autoria de Alberto Pinto Ribeiro, 1989.



As peças produzidas por Ferreira da Silva, entre elas uma gama diversificada de placas cerâmicas, eram importadas pela firma Frost Ceramics Imports, sendo comercializadas  nos EUA, tal como em Portugal, com enorme sucesso.


SECLA - conjunto de dezoito placas decorativas aplicadas sobre madeira.



Placa nº 8, mede 16 x 16 x 3 cm, marcada com o punção de Ferreira da Silva e da SECLA. Esta placa era comercializada com uns pequenos pés de borracha, podendo funcionar como cinzeiro ou outro contentor:


SECLA - placa nº 8. © CMP

SECLA - placa nº 8. © CMP

SECLA - placa nº 8, marcas. © CMP



Placa nº 7, mede 15 x 15 x 2 cm, aqui mostrada com diferentes cores e acabamentos, marcada com o punção de Ferreira da Silva e da SECLA:


SECLA - placa nº 7. © CMP

SECLA - placa nº 7. © CMP

SECLA - placa nº 7, marcas. © CMP


SECLA - placa nº 7. © CMP

SECLA - placa nº 7. © CMP


SECLA - placa nº 7, marcas. © CMP


Placa nº 1, mede 15 x 15 x 2 cm, marcada com o punção de Ferreira da Silva e da SECLA:


SECLA - placa nº 1. © CMP


SECLA - placa nº 1, marcas. © CMP


Placa nº 11, mede 15,5 x 15,5 x 2 cm, marcada com o punção de Ferreira da Silva e da SECLA:


SECLA - placa nº 11. © CMP


SECLA - placa nº 11, marcas. © CMP


Placa nº 19, mede 20 x 20 x 1,8 cm, marcada com o punção de Ferreira da Silva e da SECLA:


SECLA - placa nº 19. © MAFLS


SECLA - placa nº 19, marcas. © MAFLS


Placa nº 45, mede 19 x 19 x 2 cm, marcada com o punção de Ferreira da Silva e da SECLA:


SECLA - placa nº 45. Miller's




Estas placas decorativas foram aplicados em interiores e exteriores nos mais variados locais,  lojas, edifícios públicos, habitações, cafés etc., revestindo superfícies arquitectónicas, durante as décadas de 60 e 70, um pouco por todo o país, como podemos observar em alguns exemplos abaixo reproduzidos.




Friso decorativo no exterior de loja na Av. Almirante Reis, Lisboa. © CMP


Estabelecida em 1955 junto ao Arco da Almedina, em Coimbra, a Livraria Almedina vai crescer e sedimentar-se no mercado durante a década subsequente.
No final dos Anos 60, o seu fundador Joaquim Machado (1924-2005) decide-se pela abertura de uma nova livraria, no principal eixo do comércio coimbrão, composto pelas Ruas Visconde da Luz e  Ferreira Borges.
A Livraria Novalmedina nasce da toma de trespasse de uma tradicional casa de modas, em 1965, abrindo as suas portas em 1968, após obras de remodelação.
Durante três anos decorreram obras de ampliação no subsolo, que incluíram a construção de uma cave, tendo como fim alargar o espaço comercial, organizando-o em secções tal como faziam as grandes livrarias internacionais. 


Obras de ampliação, Livraria Novalmedina, Coimbra, 1967. Grupo Almedina


Com uma estrutura moderna, o espaço estava dividido em áreas temáticas: livros científicos e técnicos, romances, livros infantis e escolares, etc., sendo que, a coerência entre as diferentes áreas era garantida pela unidade visual criada pelo revestimento das paredes.
Da livraria, actualmente encerrada para obras de requalificação, podemos ver a fachada, abaixo reproduzida.
Placas cerâmicas da SECLA, são usadas para animar a superfície dos pilares adossados nos limites da fachada, em articulação com painéis em madeira que a percorrem horizontalmente.



Fachada da Livraria Novalmedina, Rua Ferreira Borges, Coimbra. © CMP


Detalhe da fachada da Livraria Novalmedina, Rua Ferreira Borges, Coimbra. © CMP


Detalhe da fachada da Livraria Novalmedina, Rua Ferreira Borges, Coimbra. © CMP


Interessante é verificar que embora o desgaste dos vidrados coloridos seja evidente, é também notória a conservação e nalguns casos até o reforço do vigor das texturas, nas aplicações exteriores.
Já nas aplicações em espaços interiores, como é o caso do bar da estação de caminhos-de-ferro do Entroncamento, de que se reproduzem abaixo detalhes, o colorido e as qualidades dos vidrados mantêm as suas características praticamente intactas.



Detalhe do interior do bar da estação de caminhos-de-ferro do Entroncamento. © CC


Detalhe do interior do bar da estação de caminhos-de-ferro do Entroncamento. © CC


Detalhe do interior do bar da estação de caminhos-de-ferro do Entroncamento. © CC







quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Pequenas floreiras - Aleluia

Da série de pequenas floreiras ou vasos fabricados pelas cerâmicas Aleluia, Aveiro, durante a década de 1950, publicamos um conjunto de peças, de tamanho semelhante, constituídas por volumes de forma livre e orgânica, decoradas com cores planas e contrastantes. 

O modelo 526-A, abaixo reproduzido, mede 7 cm de altura e 16 cm de comprimento, a forma biomórfica e assimétrica conjuga elementos abstractos ondulantes a preto, branco e verde, no exterior, com um surpreendente interior amarelo primário.


Aleluia - floreira 526-A. © HPS


Aleluia - floreira 526-A. © HPS


Aleluia - floreira 526-A. © HPS


Aleluia - floreira 526-A. © HPS


Aleluia - floreira 526-A. © HPS


Aleluia - floreira 526-A. © HPS


Marca de fábrica. © HPS

A peça está marcada com o carimbo relativo à celebração do cinquentenário da fábrica, 1905-1955. Esta marca foi utilizada especialmente durante o ano de 1955, assinalando o aniversário, associando-se a várias iniciativas preparadas para o mesmo efeito.

O modelo 531-A, mede 9 cm de altura e 11 cm de comprimento, usa um esquema cromático semelhante ao modelo 526-A, no entanto a sua forma é bastante mais elementar. Tendo por base um formato convencional de vaso, um tronco de cone, cujas paredes foram comprimidas.


Aleluia - floreira 531-A. © HPS


Aleluia - floreira 531-A. © HPS


Aleluia - floreira 531-A. © HPS


Aleluia - floreira 531-A. © HPS


Aleluia - floreira 531-A. © HPS


Marca de fábrica. © HPS


O modelo 565-A, apresenta duas aberturas e uma pega, sendo apenas decorado a preto e branco no exterior. Mais uma vez, o interior é de um contrastante amarelo primário.


Aleluia - floreira 565-A. © HPS


Aleluia - floreira 565-A. © HPS


Aleluia - floreira 565-A, detalhe com etiqueta da fábrica. © HPS


Aleluia - etiqueta. © CMP

Esta etiqueta ou selo de fábrica, aparece estampada em peças promocionais (por exemplo cinzeiros) ou sob a forma de autocolante, em dourado ou prateado, colada nas mais variadas peças produzidas durante as décadas de 50 e 60.


Aleluia - floreira 565-A, detalhe do interior. © HPS


Marca de fábrica. © HPS





CMP* agradece a todos os coleccionadores pelas suas contribuições e imprescindível colaboração.





segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Pratos e Castiçal - Maria de Lourdes Castro - Fábrica de Loiça de Sacavém

Maria de Lourdes Castro (n.1934) conclui, em 1954, o Curso de Pintura Cerâmica da Escola de Artes Decorativas António Arroio, onde foi contemporânea de Cecília de Sousa (n.1937) e aluna de Manuel Cargaleiro (n.1927). 
Nesse mesmo ano é convidada a trabalhar na Viúva Lamego, fábrica com enormes responsabilidades na renovação da cerâmica moderna, onde já trabalhavam outros autores como Jorge Barradas (1894-1971), Querubim Lapa (n.1925) e Manuel Cargaleiro.
A sua permanência nesta unidade fabril foi curta, tendo ingressado na Fábrica de Loiça de Sacavém em 1955, onde passa a ser responsável pela Secção de Cerâmica Moderna, criando um espaço próprio onde pôde desenvolver as suas pesquisas formais e técnicas.
Neste contexto dá início à série Arte Nova, da qual fazem parte as peças aqui publicadas.

Outras peças da mesma série: 
Barco da série "Arte Nova" - Maria de Lourdes Castro - Fábrica de Loiça de Sacavém
Varinas da série "Arte Nova" - Maria de Lourdes Castro - Fábrica de Loiça de Sacavém
Desenhos da série "Arte Nova" - Maria de Lourdes Castro - Fábrica de Loiça de Sacavém
Jarro da série "Arte Nova"- Maria de Lourdes Castro - Fábrica de Loiça de Sacavém
Prato, garrafa e copos da série "Arte Nova" - Maria de Lourdes Castro - Fábrica de Loiça de Sacavém

 
Entre 1959 e 60 passa pelas Caldas da Rainha, trabalhando como pintora na SECLA, sendo o contacto com as práticas de trabalho realizadas no Estúdio, fundamental para a sua formação.
Seguidamente parte para Faenza, Itália, como  bolseira da Fundação Calouste Gulbenkian,   onde, durante a primeira metade da década de 60, se especializa em Laboratório e Tecnologia de Cerâmica, Pintura Cerâmica e Restauro Antigo e Moderno, no Instituto Statale d'Arte per la Ceramica Gaetano Ballardini. 
Entre 1972 e 73 volta a desenhar e produzir peças para a F. L. Sacavém, passando em 1979 a desempenhar funções de consultadoria, assumindo a responsabilidade da recuperação de decorações e formatos antigos de loiça de Sacavém, bem como a criação de novos modelos, funções que desempenhará até 1982.


Maria de Lourdes Castro - prato, Fábrica de Loiça de Sacavém. © CMP


 Maria de Lourdes Castro - detalhe de prato, Fábrica de Loiça de Sacavém. © CMP

Maria de Lourdes Castro - castiçal, Fábrica de Loiça de Sacavém. © CMP

Maria de Lourdes Castro - castiçal, Fábrica de Loiça de Sacavém. © CMP


Os objectos acima reproduzidas estão expostos na mostra A Geometria das Cores, que apresenta uma selecção de peças e desenhos de inspiração geométrica, produzidos  entre as décadas de 30 e 60 e estará patente no Museu de Cerâmica de Sacavém até 31 de Dezembro de 2011.
Nas peças aqui apresentadas é notória a proximidade formal com a produção contemporânea do seu antigo mestre Manuel Cargaleiro, como pode verificar-se pelo painel de azulejos abaixo reproduzido, com notações gráficas semelhantes, ainda que com uma paleta de cores reduzida a tonalidades frias.


Manuel Cargaleiro - painel de 6 azulejos, 29 x 43 cm, 1954. FASVS


Maria de Lourdes Castro numa aula do pintor Manuel Cargaleiro, c.1953. Imagem publicada no catálogo Maria de Lourdes Castro: Uma Exposição Biográfica, edição do Museu Nacional do Azulejo, 2005.



As Artes Decorativas do pós Guerra recuperam as linguagens abstractas desenvolvidas no período entre as Guerras, originárias das propostas das Primeiras Vanguardas. 
Muitos dos  elementos estilísticos presentes na pintura e na escultura são importados para os objectos de uso quotidiano, possibilitando a inovação, tanto nas formas e volumes como no tratamento plástico das superfícies, como é notório na produção cerâmica de carácter modernista.
Maria de Loudes Castro partilha as tendências do momento, articulando grafismos, cores e texturas na criação de uma linguagem própria e individual.
Nas peças anteriores à estadia em Faenza, podem ainda sentir-se os ecos da obra do seu mestre Manuel Cargaleiro, com quem reconhecidamente partilha orientações estéticas, bem como de outros pintores de referência para a década de 50, como Maria Helena Vieira da Silva (1908-1992).



Maria de Lourdes Castro - prato, 5 x 30 x 23 cm, com punção ARTENOVA e carimbo da F. L. de Sacavém na base, c.1958-59. Imagem publicada no catálogo Maria de Lourdes Castro: Uma Exposição Biográfica, edição do Museu Nacional do Azulejo, 2005.


Maria de Lourdes Castro - fruteira tripé, 20,2 x 29 x 15,5 cm, 1958. Imagem publicada no catálogo Maria de Lourdes Castro: Uma Exposição Biográfica, edição do Museu Nacional do Azulejo, 2005.


Maria de Lourdes Castro - prato, Fábrica de Loiça de Sacavém, 1957. Mercador Veneziano


Maria de Lourdes Castro - detalhe de prato, Fábrica de Loiça de Sacavém, 1957. Mercador Veneziano


Maria de Lourdes Castro - prato, Fábrica de Loiça de Sacavém, 1957. Mercador Veneziano


Marca na base, 1957. Mercador Veneziano



Maria de Lourdes Castro - grande prato da série ARTENOVA, F. L. Sacavém, c. 1960. © MAFLS

Marca na base. © MAFLS


Do Abstraccionismo Lírico de Kandinsky (1866-1944) às experiências de Paul Klee (1879-1940), passando pelas pesquisas geométricas de Mondrian (1872-1944) e Malevitch (1879-1935) ou ainda pelo Futurismo ou o Raionismo russo, muitas podem ser as referências paras as composições abstractas do pós Guerra. 
Nestas variações decorativas desenvolvidas por Maria de Lourdes Castro, encontramos jogos de linhas diagonais ou curvas, delimitando formas irregulares preenchidas com cores planas que contrastam com fundos de fortes texturas visuais.



Wassily Kandinsky, Composição X, 1939.


Vieira da Silva, Paris de Noite, 1951.


Maria Helena Vieira da Silva, guache sobre tela, assinado e dedicado a Manuel Cargaleiro, 1952. MMC


Vieira da Silva, cuja obra, apesar de se desenvolver no seio da chamada Escola de Paris, parece evocar a quadricula da azulejaria portuguesa através de tramas e teias dinâmicas, estabelece uma proximidade com Manuel Cargaleiro no início da década de 50. 
Esta cumplicidade durará até a sua morte, nos Anos 90, e deverá manifestar-se de várias formas em diversos momentos das obras dos dois artistas. 
É portanto natural que peças produzidas na década de 50 por Manuel Cargaleiro, como o desenho decorativo para um prato da Vista Alegre abaixo reproduzido, evoquem de algum modo a obra da pintora, fornecendo o contexto ideal ao desenvolvimento dos traçados decorativos de Maria de Lourdes Castro da mesma década.



Manuel Cargaleiro - desenho decorativo para prato da Vista Alegre, 1956. © MAFLS




CMP* agradece a cedência de imagens aos autores dos blogues: